sábado, 12 de março de 2011

PORTUGAL E POLÍTICOS POR EÇA NO ANO DE 1900..


A Ilustre Casa de Ramires
ESCRITO EM 1900, ANO DO SEU FALECIMENTO, JOSÉ MARIA EÇA DE QUEIRÓS ESCREVE NUMA DAS PÁGINAS DO LIVRO "A ILUSTRE CASA DE RAMIRES:

" Gonçalo escutara, num silêncio risonho e superior, enrolando laboriosamente um cigarro com o tabaco do Barrolo:
- Vocês não compreendem... Vocês não conhecem a organização de Portugal. Perguntem aí ao Gouveia ... Portugal é uma fazenda, uma bela fazenda, possuida por uma parceria. Como vocês sabem há parcerias comerciais e parcerias rurais. Esta de Lisboa é uma «parceria políctica», que governa a herdade chamada Portugal ... Nós os portugueses pertencemos todos a duas classes: uns cinco milhões que trabalham na fazenda, ou vivem nela a olhar, como o Barrolo, e que pagam, e uns trinta sujeitos em cima, em Lisboa, que formam a parceria» , que recebem e governam. Ora eu, por gosto, por necessidade, por hábito de família, desejo mandar na fazenda. Mas, para entrar na «parceria políctica», o cidadão português precisa de uma habilitação - ser deputado. Exactamentecomo, quando pretende entrar na Magistratura, necessita de uma habilitação - ser bacharel. Por isso procuro começar por deputado, para acabar como parceiro e governar ... Não é verdade, João Gouveia?
O administrador voltara á bandeja das sangrias, de que saboreava outro copo, agora lentamente aos goles.
- Sim com efeito, essa é a carreira ... Candidato, deputado, político, conselheiro, ministro, mandarim. É a carreira..."

E mais adiante na última página do livro Eça através da personagem de João Gouveia, enumera as caracteristicas de Gonçalo Ramires que são afinal as do nosso povo e de Portugal:

 "...franqueza, doçura, a bondade, a imensa bondade..."," ....os fogachos e entusiasmos, que acabam logo em fumo, e juntamente, muita persistência, muito aferro quando se fila á sua ideia...a genorisidade, o desleixo, a constante trapalhada nos negócios, e sentimentos de muita honra, uns escrupúlos quase pueris....a imaginação que leva sempre a exegerar até á mentira, e ao mesmo tempo um espiríto prático, sempre atento á realidade útil. A viveza, a facilidade em compreender, em apanhar....a esperança constante nalgum milagre, no milagre de Ourique, que sanará todas as dificuldades... A vaidade, o gosto de se arrebicar, de luzir, e uma simplicidade tão grande, que dá na rua um abraço a um mendigo ... Um fundo de melancolia, apesar de tão palrador, tão sociável. A desconfiança terrível de si mesmo, que o acobarda, o encolhe, até que um dia se decide, e aparece um herói que tudo arrasa ...Até aquela antiguidade de raça, aqui pegada á sua velha Torre, há mil anos ...Até agora aquele arranque para a África ...Assim todo completo, com o bem, com o mal, sabem vocês quem ele me lembra?
-Quem?

- Portugal"

Sem comentários: