sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

UMA BIPOLAR...



O céu estava azul,a temperatura agradável, cheio de sol, de energia e de vida, mas para Catarina, era só mais um daqueles dias...deprimente, e com um forte sentimento de dor e sofrimento.

Levantou o braço e cheirou a axila, decidiu que passava muito bem sem ir ao duche matinal.
Naqueles dias, um duche era qualquer coisa de tão penoso e árduo, que se pudesse evitá-lo, fá-lo-ia.


Tomou a bica no café do Sr. Zé e olhou em seu redor... Aquelas velhas todas sempre ali, com um ar medíocre e pequeno...detestava-as.

Em vez de se dirigir para a loja, decidiu ir tomar um copo ao bar da praia.

No carro, substituiu o Cd, por outro com música de Jazz.

Desde de muito cedo, cultivou o seu gosto pela música.Filtrou o que o mercado oferecia, e preferiu a qualidade.

Ouviu Diana Krall até chegar á esplanada da praia. Sentou-se numa mesa de frente para o mar, pediu meio Jameson com três cubos de gelo, e puxou por um cigarro.Olhou para o mar e inalou bem o fumo.

O mar pensou, nunca me de transmitiu grande paz ou tranquilidade.

De facto, o mar fazia-lhe despoletar certos sentimentos, como a nostálgia.

Veio-lhe á lembrança, o dia que o psiquiátra disse categóricamente que era uma bipolar.
Foi a primeira vez que ouviu aquela expressão. O psiquiátra explicou, que geralmente dava-se o nome aos doentes de maníaco-depressivos.
Ao ouvi-lo, Catarina ficou em silêncio e com os olhos cheios de água, acabrunhada, balbuciou: "tem a certeza?" - " Sim absoluta", respondeu.
Durante uns momentos houve o silêncio, o tempo suficiente para Catarina respirar e empertigar-se:" por favor Dr., se esta doença tem cura ou tratamento, diga o que tenho de fazer"

De imediato iniciou a medicação á base de lítio.

Ao longo do tempo, foi obrigada a fazer vários ajustes, quanto ao tipo e doses de medicamentos.

Passou pela perca de cabelo, náuseas, e problemas causados por um forte odor corporal, como consequências adversas do próprio tratamento.

 

O que a levou naquele dia a ir ao psiquiátra, foi o facto de estar a atravessar uma depressão profunda e horrível, fruto de um romance falhado.

 

Paulo, atraente, administrador de um banco, hilariante, fazia Catarina rir e descontrair-se.

Mimava-a muito, levando-a a bons restaurantes e escolhendo criteriosamente os vinhos, que juntos apreciavam.

Passavam horas inesquecíveis a conversar e de boa disposição.

Mas depressa a paixão perdeu o seu brilho e encanto. Paulo, tinha problemas de impotência sexual, e a sua boa disposição, acabava invariavelmente em momentos de frustação e de fracasso.

Para se justificar, dizia que só acontecia aquilo com Catarina.

Insegura, aceitou a proposta de Paulo, não desistiriam daquela relação, que só naquele aspecto não resultava.

Queriam estar sempre juntos, todos os dias, e todos os dias, Paulo e Catarina falhavam no que a natureza não deixava.

Por fim, conseguiu convencer Paulo a ir a um médico.
Nesta altura, já Paulo tinha um aspecto horrível, uma sombra do que era quando a conheceu. Os médicos nada adiantavam, até se proceder a uma série de exames.
Catarina nunca chegou a saber o resultado dos mesmos.
Chegados de um fim de semana, de um hotel de sonho, as suas caras eram de fracasso e de profunda tristeza.
Não havia hoteis, vinhos ou risos, que conseguissem apagar a desilusão, de uma noite não consumida pelo prazer. Tudo se desmoronava.
Paulo decidiu por termo aquela relação.

Catarina não se conformava. Aparentemente aceitou, mas era só fachada.

Deixou progressivamente de comer, de dormir, começou a beber e a fumar cada vez mais.
Negligenciou o trabalho e as responsabilidades. A sua casa estava suja e desorganizada. Só saia para comprar o que não precisava, sem conseguir controlar um desejo imparável de consumir.

Estava sem dinheiro, como se não trabalhasse, menos dinheiro tinha. O seu unico alívio, era andar de carro horas e horas a fio, sem parar...sem destino.

Foi por aí, que decidiu ir ao psiquiátra.

Após aquele diagnóstico, Catarina passou a conhecer-se melhor.
A bipolaridade só por si, já explicava muita coisa passada na sua vida. As suas paixões, por vezes inexplicáveis e cíclicas, previsivelmente dadas ao fracasso, eram uma delas.
Aprendeu a evitar tais picos. Sabia quando subia muito rápidamente uma escadaria sem um objectivo, o resultado seria necessáriamente descer vertiginosamente, provocando-lhe dor e sofrimento.
Agora sabia o porquê.
A partir daí foi uma aluna aplicada e disciplinada, tomando cuidadosamente os medicamentos prescritos pelo médico. O que mais queria e desejava, era ser emocionalmente estável e equilibrada.

A empregada de mesa abeirou-se, e perguntou-lhe delicadamente se queria outro whisky, "Outro whisky? penso que não obrigada".

Pensou: "Já chega de praia, whisky e tabaco, vou mas é trabalhar!".

Seguiu para casa, arranjou-se e foi para a loja.

Catarina sabia, que tinha uma luta pela frente, sem tréguas e que só terminaria com a morte. Não estava disposta a desistir...


Sábado, 9 de Maio de 2009 

Helena de Brito












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